CDT: O que te atrai no trabalho da CIA?
Diogo: A forma e os objetivos do seu trabalho, privilegiando sempre o elemento coletivo e a criação de peças com mensagens
bem fortes e com as quais me identifico bastante.
CDT: Qual sua impressão de The Tutor ao ler o texto?
Diogo: A peça não é tão fácil de entender. A primeira impressão gera um certo interesse, mas é preciso ler com mais
atenção para perceber tanto a profunda mensagem quanto o apuradíssimo humor nela presentes.
CDT: Como foi, para você, o processo de montagem?
Diogo: Muito esclarecedor e produtivo. O processo foi totalmente aberto para a criação dos atores, e as discussões
eram muitas. Isso gerou uma compreensão enorme sobre a peça e sobre o próprio trabalho do ator em uma peça brechtiana.
CDT: O que acha do texto e da peça?
Diogo: O texto é conturbante: apesar de ser divertidíssimo, ele cria uma pressão constante sobre o leitor, que vê o
preceptor sendo cada vez mais e mais massacrado na sua personalidade, na sua sexualidade, e o que é aterrador é que ele assume
esse massacre, e passa a assumi-lo como atitude própria. O trecho do epílogo que menciona o preceptor como produto e produtor dessa raça monstruosa exemplifica perfeitamente um dos pontos centrais da peça, que
destrói o conceito da formação de caráter burguesa e arruína o conceito de pró-atividade, tão na moda nos últimos anos. Acho
que a peça tem uma função desconstrutiva sobre a moral burguesa, e mais ainda, sobre a própria ética cristã contemporânea,
que talvez só seja comparada à genialidade de Nietzsche ou à minuciosidade de Adorno.
CDT: Qual (s) seu (s) personagem (s)? Qual a importância deles para o espetáculo?
Diogo: Tenho 3: Count Wermut, Pastor e Wenzeslaus. O primeiro acho que serve como um elemento de humor mais ridículo,
trabalhando sobre um esteriótipo para criar esse personagem muito engraçado, mas que no fundo também passa uma séria mensagem
social. No caso do segundo, ele garante um vínculo do preceptor com seu passado familiar, mostrando de onde vem essa classe
social que são os preceptores. No terceiro caso, o personagem serve como um dos grandes castradores da peça, por assim dizer,
mostrando um lado que até então não havia sido mostrado sobre o ensino burguês. De certa forma, ele serve de contraponto à
figura do preceptor, e aí entra a profunda ironia brechtiana, pois com Wenzeslaus, muito mais do que com o Major, o preceptor
é profundamente reprimido.
CDT: Como se sente nesse período próximo da estréia?
Diogo: Normal, na verdade. Um pouco ansioso, inseguro sobre algumas coisas que ainda não estão completamente acabadas
ainda, mas nada de mais. Apenas aquele nervosismo que sempre tenho, pois nunca acho que o trabalho esteja pronto- sempre vejo
falhas e coisas que podem melhorar. Claro que, se dependesse de mim, provavelmente nunca apresentaríamos, porque sempre haverá
algo a melhorar!Também não escondo que estou um pouco impaciente, por que no fundo também mal posso esperar para mostrar todo
o trabalho que tivemos por quase um ano para fazer esse peça, e ver o que as pessoas acham dos resultados.
CDT: O que espera da temporada?
Diogo: Bem, esperar eu espero que todas as apresentações estejam com teatro cheio, que todos entendam o que queremos
passar e adorem a peça, ou, pelo menos, que pensem sobre ela!
CDT: Qual sua relação com o teatro antes dessa montagem e qual agora?
Diogo: Acho que principalmente amadureci na minha visão sobre o papel do ator. Trabalhamos bastante sobre a questão
do distanciamento brechtiano, e pela primeira vez percebi como a função do ator na verdade varia muito dependendo da peça
produzida, e como uma peça é, na verdade, feita muito mais pelos atores do que pelo autor ou mesmo pelo diretor. Minha crença
de que o teatro coletivo, ou seja, feito sempre pelo grupo e não por indivíduos, é muito mais rico, ficou muito mais forte.